Casamento de Ana Leal com Francisco Cruz, no ano de 1958.
Em tempos não muito longínquos, nas
pequenas aldeias, os casamentos eram para além da solenidade que o acto
impunha, momentos muito vividos e participados pelas famílias dos noivos e
naturalmente também pelos respectivos convidados. Estes acontecimentos mobilizavam
sempre grande número de pessoas, pois toda a preparação da boda e a
sua ligação a um certo tradicionalismo que se cumpria em
todos os pormenores, exigia tempo para a sua realização. Mandavam os
costumes, que era incumbência dos pais dos noivos a quem cabia grande parte
desses cuidados! Eram engordados os porcos, os borregos e as
galinhas, para que no dia a comida fosse farta e a contento de
todos! As bodas eram para além da sua razão suprema, dias de grande festa nas
aldeias!!!
Uma das maiores responsáveis para que nada fosse deixado ao acaso, em termos culinários, passava naturalmente pela cozinheira! No Pombalinho houve uma senhora que talvez
tivesse sido a mais requisitada para estas andanças! Chama-se Clementina e
devido aos seus saberes e experiências, foi durante muitos
anos a mais solicitada pelos noivos e em quem eles confiavam
inteiramente toda a organização culinária da boda!
Com alguma antecedência, mais ou menos um
mês, cumpria-se um ritual preparatório
da boda que era o que então se entendeu chamar de “visitas“. No fundo tratavam-se de gestos de cordialidade com que os pais dos noivos queriam presentear todas as pessoas da sua estima, e que constava da oferta de uma travessa de arroz doce composta de coscorões e bolinhos de noiva! É
claro que a este simpático gesto estava subjacente um certo sentido monetário da oferta, porque em bom
rigor o que se pretendia era conseguir algumas compensações monetárias que
minimizassem os custos inerentes à realização da boda !
No dia do casamento, logo pela manhã, era
prática de entre alguns convidados dirigirem-se ao local onde iria
decorrer o banquete, para ali saborearem o tão apreciado fricassé! Este
característico pitéu era um guisado feito com fígado de porco, algumas
gemas de ovos e temperado com limão, salsa e outros condimentos a condizer!
Era apreciado por todos os que, logo bem cedo, não queriam perder
pitada da festa que se avizinhava ser de muita participação e
alegria.
Depois da cerimónia religiosa do casamento
e dos registos fotográficos de circunstância, chegara finalmente a hora do
banquete! No Pombalinho, algumas casas existiram de dimensões exigíveis
para este serviço! De entre outras, havia uma
construída para o efeito pelo José Guilherme anexada à sua
casa de habitação. Ali se realizaram, talvez, os últimos banquetes
de casamentos realizados no Pombalinho.
As mesas rectangulares e de bancos
corridos, eram dispostas ao longo do salão, desde a zona da cozinha até bem
perto da porta de entrada! O cheiro a borrego guisado com ervilhas e
batatas, ao invadir o apetite dos mais esfomeados, sinalizava
de que estava para muito breve o início do almoço! As mulheres que serviam
as mesas, entravam perfiladas pelo salão com as panelas da sopa! A
tradicional canja de galinha começava a ser servida para aquecer,
finalmente, os estômagos dos mais impacientes!
Durante o almoço e já na sua parte
final começavam-se a ouvir os primeiros acordes musicais do acordeonista ou do
conjunto musical que tinham sido contratados para abrilhantar o ambiente
da boda! Vem à memória nesta pequena viagem pela história dos
casamentos que se realizaram no Pombalinho, o famoso conjunto de Figueira Padeiro,
mas também o conhecido António Rufino e a sempre saudosa Victória da
Silva. Ao som de todos eles, os mais dançarinos abandonavam as mesas e davam
início ao baile! Os noivos mereciam um ambiente de festa e de muita
alegria que envolvesse todos os participantes!
Depois viria o jantar, que não era muito
diferente do almoço! As pessoas já mais libertas de alguns
formalismos tendiam a soltarem-se mais um pouco! A animação ainda viria a
tingir momentos altos! À mesa começavam-se a ouvir as primeiras
"vivas" aos noivos, aos pais dos noivos e também aos
padrinhos! Os mais afoitos e criativos na construção de quadras poéticas,
pediam licença a todos os presentes, levantavam-se e de copo de vinho
bem lá no alto segurado por uma mão já por vezes trémula, lá diziam a sua
"viva" .
"A
todos os presentes eu dou
Um
viva com emoção!
Para
os noivos eu quero dar
Um
abraço do coração!"
É claro que a partir daqui a animação atingia outros níveis e a
música tomava conta de toda a gente!!! Chegavam-se a fazer verdadeiros despiques sobre a quadra mais bem construída! A
intensidade das ovações protagonizada pelos presentes, classificava a melhor de
entre todas! Na parte final do jantar e enquanto este ainda decorria,,
tinha chegado a hora do pessoal da cozinha; improvisavam pequenas marchas
de homenagem aos noivos, ao som das batidas das tampas das panelas e
percorriam o corredor central do salão em ambiente de natural alegria!!!!
Já pelas altas horas da noite, os
convidados começavam individualmente a desejar aos noivos as
maiores felicidades para a vida que agora em comum iriam iniciar! Era a boda que lentamente se aproximava do seu fim!
Colaboração fotográfica - Fernando Leal
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4 comentários:
Muito bonito, tanto o texto como a fotografia.
Por acaso sabe em que ano foi esse casamento?
Eu gostava tanto de saber, mas não diz no texto.
Obrigada.
Boas recordações, Manuel Gomes.
Já agora, deixe-me contar que, ao que julgo,fui o primeiro a dizer duas quadras seguidas de "vivas" aos noivos nos casamentos, cuja realização, como lhe é peculiar, tão bem descreve. E lembro-me perfeitamente que o fiz no casamento do Joaquim Anastácio, cuja boda se realizou no Casal
Rebelo, onde moravam os pais do noivo.
Se mais alguém o fez depois, não sei.
E já agora, por falar no Joaquim Anastácio e em versos, deixe-me também lembrar que ele, apesar de, se bem me não engano,analfabeto, dedicou-se à poesia com assinalável merecimento.
Um grande abraço.
Guilherme Afonso
Tomando como referência, a menina que está ao centro da fotografia, penso que este casamento se terá realizado no ano de 1958.
Caro Amigo Guilherme!
Tem razão, são belas recordações! Não tanto pelo efeito directo do texto desta publicação, mas pelos tempos que o mesmo nos propicia percorrer nas nossas memórias!
De facto, os casamentos eram (foram) inesquecíveis festas familiares!!!
Um Abraço
Mnuel Gomes
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