27 julho 2020

O último barbeiro do Pombalinho!





SER BARBEIRO E NÃO GOSTAR DE O SER..., ou uma simples e breve história de vida!

De Raúl Pica Sinos recebemos um maravilhoso texto sobre uma breve conversa que ocasionalmente este nosso amigo teve com Heliodoro da Silva Bacalhau, mais conhecido por “Sevilha”, na sequência de uma sua ida à barbearia daquele que poderá ser o último neste ofício no Pombalinho. Começa assim o admirável diálogo:


RPS - Meu amigo, esta cadeira cheia de velhas e muitas histórias bem poderia honrar o jardim da aldeia se lá pudesse ser colocada!
HSB - Essa ideia já vem tarde, o Dr. Luís Filipe, vereador da Camara Municipal da Golegã e Ex-Presidente da Junta, já a pediu. Pode ter a certeza, quando as mãos me tremerem, essa honra ser-lhe-à feita.

RPS - Já sentado, vejo refletido no espelho o constante movimento dos seus velhos dedos, segurando o meu cabelo em mechas, com vistas ao corte certo da inigualável tesoura. E quase em surdina oiço-o dizer:
HSB - Vou fazer-lhe uma confidência: quando na adolescência, tinha para aí cerca de 12 anos, então aprendiz numa barbearia do José Reis, situada na vizinha aldeia onde Saramago nasceu, estava longe de imaginar que ser barbeiro era a profissão que viria a abraçar para a vida. Confesso que muito mais tarde, foram muitas as noites que sobre o travesseiro as duvidas me sobressaltaram.

RPS - Sem o interromper, ouvia-o com curiosidade. Era notória a necessidade de desabafar.
HSB - Oiça, enquanto aprendiz, o talento do mestre, o meu subsequente entendimento para a aprendizagem originou, com a ajuda do meu pai, começar a trabalhar por conta própria, em casa alugada, na Rua Manuel Monteiro Barbosa no Casal do Campo com a idade de 15 anos.

RPS - Corria então o ano de 1958.
HSB - O trabalho era coisa que não faltava para as quatro barbearias então existentes no Pombalinho. Aos sábados a clientela não faltava. O Veríssimo tinha a sua situada no cruzamento das ruas 5 de Outubro com António Eugénio de Menezes. Acumulava com a arte, alguns serviços de enfermagem. A do Carlos Cavaco, estava lá para o largo da igreja e a do António “Barbeiro”, estava situada na rua Barão de Almeirim, mesmo em frente à fonte do mesmo nome.

RPS - Acrescentando:
HSB - Aos vinte anos veio a tropa. Com o desenvolvimento da guerra colonial fui (como milhares de outros jovens) mobilizado, com a especialidade de soldado barbeiro para Angola. Quando voltei, abracei de novo a arte. Fui trabalhar a “meias” com o já idoso António “Barbeiro”. Tomando, um pouco mais tarde, a barbearia por trespasse a troco de lhe cortar o cabelo e fazer a barba enquanto fosse vivo.
Os apuros eram satisfatórios. Por lá fiquei largos anos. Mas jovem e irrequieto, estar preso entre quatro paredes em pé horas a fio, a rotina do trabalho, ouvir repetidas vezes as mesmas anedotas, os mesmos gracejos, ouvir as “boas novas já velhas da aldeia” ter que opinar sobre conversas sem ter vontade para tal, começava a ser um tormento.
Certo dia, já na casa dos 30 e tal anos, um dos meus clientes, o agricultor Manuel Gamarales, chamou-me à razão e disse-me que eu já tinha idade para me casar e constituir família. E que uma sua ex-empregada, moradora para os lados do Pombal, era uma boa rapariga, trabalhadora e muito responsável! Devias de a conhecer e de lhe escrever, disse-me ele, e deu-me a sua morada.
Assim fiz. Escrevi-lhe uma carta a contar-lhe os meus mais honestos propósitos. O encontro foi na estação do caminho-de-ferro em Pombal. Casamos pela igreja na aldeia Santiago da Guarda em Ansião. Tinha eu então 38 anos.
Pouco tempo depois, passei todo o aparato da loja da Rua Barão de Almeirim para uma parte da nossa casa na Estrada Real. Deixei toda aquela azáfama e procurei outra vida profissional. Trabalhei em várias empresas e em diversas profissões: na fábrica de carnes em Rio Maior, na fábrica de confeções em Santarém, na Junta Autónoma, como pastor, maltês, passando a ser barbeiro apenas aos fins-de-semana, ou na barbearia Moderna em Santarém, quando me solicitavam.
Hoje, já reformado, trato da minha horta que é grande e aparo alguns cabelos, graciosamente ou a troco de um “café,” quando os amigos me pedem. Não estou nada arrependido.
Não esqueço e estou grato ao cliente que me deu a morada daquela que foi a mulher da minha vida.

Pombalinho, 25 de Julho, de 2020
Raúl Pica Sinos



20 julho 2020

Família Condeço





Da  esquerda para a direita, Inês Dias Condeço, Luísa Dias Condeço, Maria Dias Condeço e João Dias Condeço.
Fonte – João Condeço